“Desligue
sua mente, relaxe e flutue correnteza abaixo...” canta John Lennon de forma
etérea na abertura lírica da última faixa, Tomorrow Never Knows. O conselho não
poderia ser mais apropriado depois da enxurrada sonora que o disco proporciona.
E, convidativa também! Dá vontade de ouvir tudo de novo. E, de novo. E, de
novo...
Revolver
começa com a contagem despretensiosa de Taxman, na qual George Harrison dá uma
espetada psicodélica nos altos impostos da terra da rainha. Eleanor Rigby,
talvez seja a faceta mais estranha que a pop music já tenha usado para falar de
solidão até então. Até hoje ainda o é! As cordas, a melodia triste...
John
Lennon dá as cartas no desbunde à preguiça em I’m Only Sleeping, chamando de
loucos os que o chamam de preguiçoso no mundo corrido da Swingin’ London do
meio dos anos sessenta... Enquanto isso George nos fala sobre a finitude das
coisas e da urgência de amar e de ser amado, no embalo de um bailão indiano
chamado Love You To.
Here
There and Everywhere, com seu arranjo sublime e vocal de apoio à lá Motown,
prega o amor em qualquer lugar. Paul McCartney, romântico em uma balada
deslumbrante para dar aquele xaveco certeiro na moça incauta dos seus sonhos...
A lúdica Yellow Submarine nos leva pra debaixo das ondas do mar verdejante e do
céu azul onde todos têm tudo de que precisam vivendo dentro do tal submarino
amarelo e ouvindo uma banda que começa a tocar. Loucura pouca é bobagem... Mas,
funciona!
John
tenta convencer uma garota paranoica e depressiva de que tudo ficará bem igual
a como era quando ele era garoto, em She Said She Said... Então o clima sofre
uma virada e Paul dá bom dia aos raios de sol, com um fraseado de piano matador
na otimista Good Day Sunshine.
Sabe
aquela frase “você está tão feliz, parece até que viu um passarinho verde”? Essa é a sacada de And Your Bird Can Sing. Todo
mundo tão feliz, todo mundo tão contente que dá vontade de rachar o bico de
rir… E eles riram muito! Sugiro uma conferida no outtake na versão do
Anthology... Qual seria o combustível de tanta felicidade?
‘For
No One’ traz McCartney travestido como um pequeno Schubert na tristeza da
descoberta de que o grande amor da sua vida não te quer mais... Pra todos os
males, há toda cura. Então, eis que surge ‘Dr. Robert’! O gente fina das horas
desesperadas. Aquele que trazia o combustível para a alegria sem fim de And
Your Bird Can Sing.
Segue-se
com a timidez de George, que é traduzida em versos em I Want To Tell You e a
sua dificuldade de conversar com a garota é pintada em cores nas conversas que
ele tem consigo mesmo, sobre ela!
Got
To Get You Into My Life que, a princípio, parece ser uma das músicas mais
românticas dos Fab Four mas, que na verdade, a garota seria uma tal de Maria
Joana... Ah, Dr. Robert... Quem imaginaria que os Beatles colocariam uma ode à
maconha em um dos seus discos, conforme Paul revelaria anos mais tarde em sua
biografia Many Years From Now, de Barry Miles?
Por
fim, do alto das montanhas do Himalaia surge o convite de John Lennon, retirado
do Livro Tibetano dos Mortos, na caleidoscópica Tomorow Never Knows, para
fechar essa obra-prima com chave de ouro (e ácido). Desligue sua mente, relaxe
e flutue correnteza abaixo... Revolver continua batendo um bolão depois de 53
anos!
Por Alysson de Almeida
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