Beatlegrafia - Duas resenhas para Abbey Road!



"... tem o poder de nos transportar para Londres, e nos faz sentir dentro do estúdio Abbey Road."

Eu gostaria de ter vivido a mesma sensação de um fã contemporâneo da banda em poder, em 26 de setembro de 1969, ter ido a alguma loja comprar meu vinil, retirar da embalagem, sentir o cheiro, tentar desvendar alguma mensagem subliminar na capa. Mas, voltando em terra firme, o máximo que posso fazer é, enquanto escrevo este texto, ouvir novamente (pela milésima vez) cada música do ICÔNICO Abbey Road (remasterizado), em um fone de ouvido de alta qualidade, digerindo cada detalhe, cada nota musical e tentando perceber algo que não havia percebido.

Em Come Together, como são incríveis as harmonias entre a guitarra, o baixo e a bateria! Um rockvintage de primeira grandeza. Neste momento, continuo vivendo a experiência de escrever enquanto ouço, Something. Sei executar esta  linha de baixo - confesso, é minha preferida entre todas deste álbum. Agora, ao ouvir George solar, posso analisar também como fã e músico, um solo extraordinário de guitarra, que cabe perfeitamente na música. Realmente, Pattie  Boyd não mereceu sequer um segundo da inspiração de George nesta música, e a música se tornou maior do que ela, que ninguém mais sabe quem é!

Neste momento, enquanto ouço Maxwell's Silver Hammer, pude perceber tantos detalhes, que outrora não havia percebido: o uso sutil de algum sintetizador, ou algo do tipo, bem discreto ao fundo. Paul às vezes nitidamente canta rindo! Não é que a música é até agradável. Eu sempre a pulava nas audições anteriores.

Acabo de perceber, que se vier a detalhar música por música, o texto se tornaria uma bíblia! Continuarei ouvindo, mas sintetizando mais minhas observações.
Oh Darling... Outra linha de baixo espetacular, viciante que proporciona um enorme prazer sua execução. Sem dizer a  distorção vocal de Paul, um show a parte. Ouço aqui harmonizações vocais que nunca havia percebido antes... Quanta riqueza!
I Want You (She So Heavy): John coloca pra fora toda sua qualidade vocal de modo visceral, enquanto George o acompanha com a mesma melodia na guitarra. Incrível!

George, sempre foi meu Beatle preferido e Abbey Road tem sua assinatura. Além de Something, ainda nos presenteou com Here Comes The Sun! Pesquisando um pouco mais sobre essa música, descobri que George a compôs no jardim da mansão de Eric Clapton, em um dia lindo de sol, após um período estressante de gravações e clima tensos em estúdio. Outra curiosidade que eu não sabia é sobre o uso de sintetizadores Moog nesta música e em diversas outras do álbum. O Moog era um recurso tecnológico de recente utilização em estúdios, mas George Martin conseguiu utilizar na medida exata.


Because, as mais lindas harmonizações vocais, seguidas de uma melancólica melodia de piano, ou guitarra. Em You Never Give me Your Money, outra linha de baixo extraordinária e harmonizações vocais perfeitas. É uma música que cresce a medida em que a ouvimos. Na mesma medida possui nuances incríveis, que nos fazem viajar no som.
Enfim, continuarei ouvindo, mas em resumo deixo aqui minha conclusão: Abbey Road é uma obra de arte do começo ao fim! Até suas rebarbas, como Her Majesty por exemplo, são interessantes.
Estou ouvindo agora Mean Mr. Mustard... Que linha de baixo espetacular! Acho que, provavelmente, utilizaram um sintetizador no lugar do contra baixo.

Em Golden Slumbers, podemos perceber toda a grandeza musical dos caras, juntamente com uma orquestra ao fundo de forma complementar. Algo muito avançado para a época.
Mas, o mais importante deste álbum é que ele tem o poder de nos transportar para Londres, e nos faz sentir dentro do estúdio Abbey Road. Existe muita vida nestas músicas, e caso viéssemos a fragmentar cada música em camadas isolando cada instrumento, arranjo, letras, seria algo para passar um fim de semana trocando ideias, e descobrindo muito mais sobre Beatles.


por Hedder Braga
Ex músico, atual  e eterno fã de Beatles.



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"...um álbum de ROCK AND ROLL, acima de tudo"

Em uma resenha anterior, havia escrito que, para uma completa imersão na obra dos Beatles seria interessante que se levasse em consideração todo o contexto histórico e inclusive o contexto das relações pessoais dos integrantes e de todo o pessoal que os permeava, em cada álbum. Pois bem, quando se fala de Abbey Road, percebe-se exatamente que o álbum, que é por muitos considerado o melhor legado do Fab Four, é o resultado da maturidade musical do grupo e inclusive da já desgastada relação entre eles.

É interesse perceber, nesse cerne, que o fato de as relações pessoais do grupo já estarem bastante desgastadas – havendo atingido seu ápice durante o processo de criação e principalmente, gravação do Let It Be (que foi o último a ser lançado, apesar de suas músicas terem sido gravadas anteriormente ao Abbey Road) – parece ter tirado principalmente de Paul e John o melhor de seu poder de criação, compilando-se inclusive músicas inacabadas em obras-primas orquestradas e harmoniosamente compiladas – vide “Mean Mr. Mustard” a “Carry That Weight” (aqui também poderíamos falar de tretas refletidas nas letras, mas deixa pra uma próxima!).

Contudo, pessoalmente (trata-se de gosto MUITO pessoal), o que mais me agrada no Abbey Road é a consolidação da obra de George Harrison. É nesse álbum que o seu espírito criativo está reconhecidamente mais aflorado e respeitado dentro do contexto da banda… precisa falar algo mais além de “Something”? Sem desmerecer a “Here Comes The Sun”, claro.

Pra não fugir muito do aspecto contextual, é também interesse perceber, além de riffs bem feitos e refrões “chiclete”; inovações técnicas – ou seja, de equipamento, mesmo – que passaram a ser utilizadas na época, como por exemplo, a inclusão de sintetizadores (o avô dos teclados – pra não falar dos samplers de hoje em dia).

Enfim, pra você que quer ter um primeiro contato com o álbum, poderia te dizer que o que me agrada muito no Abbey Road é que trata-se de um álbum de ROCK AND ROLL, acima de tudo (não sou eu quem disse, foi o próprio John; pode pesquisar). Se você não é fã mas tem curiosidade sobre o álbum, mas ainda não tem aquele gosto por baladas ou músicas mais introspectivas, ouça “Come Together” e “Oh! Darling” (se é que você teve a capacidade de morar no Planeta Terra e não ter ouvido ambas, mesmo que sem querer, até hoje! Kkkkkk); a partir daí, você vai entender a pegada do disco, deixando-se levar pelas demais músicas, até não conseguir tirar o martelinho de “Maxwell’s Silver Hammer” da cabeça!


por Bruno Reis Soares
Advogado, músico - vocalista da banda OFFENCE.







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