Birkenhead, 18 de agosto de
1962.
Meu nome é William Thomas, mas
meus amigos me chamam de Bill. Trabalho de zelador no Hulme Hall, na 23 Bolton
Rd., em Birkenhead, condado de Merseyside. E, nas noites de baile, também sou
responsável por ajudar os artistas na montagem do palco. Quase um contrarregra,
ou um quebra-galho.

do rio Mersey. Praticamente, nossos vizinhos. Eles já tocaram aqui duas
ou três vezes no ano passado. O pessoal adorou! Muitas bandas de Liverpool
fazem sucesso desse lado do rio. Virei fã e amigo de todas elas. E, quase todo
esse pessoal é da minha idade. Vinte e dois anos.
Quando a banda chegou, os
ajudei a descarregar os equipamentos e instrumentos da pequena van preta. O
motorista deles, Neil, também nos deu uma força. Gente boa e engraçado, ele.
Já dentro do Hulme Hall, notei
que o baterista deles, Pete, não estava com eles. No seu lugar, para minha
surpresa, estava Ringo Starr, da Rory Storm and the Hurricanes. Achei estranho
e não entendi. Perguntei pro Neil: 'O que houve com o Pete". "Pete
foi substituído há algumas semanas. Ele não estava se encaixando com o que os
rapazes queriam para o som da banda", respondeu ele. "Mas, qual é a do Ringo? Substituto
ocasional? Freelancer?" voltei a questiona-lo. "Não! Ringo agora está
definitivamente conosco", respondeu-me Neil Aspinal, com cara de moleque
que estava a fazer traquinagens.
Ringo bem jovem ainda no Rory and the Hurricane
“Não é possível que o Ringo
vai deixar o Rory para se juntar aos Beatles”, pensei comigo. Afinal, Rory
Storm and the Hurricanes, àquela altura, era a maior banda de Liverpool. A que
fazia mais sucesso com o público.
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Primeira foto dos Beatles com Ringo, tirada 4 dias depois, no Cavern |
Bom, enfim... Os ajudei a
montar os equipamentos no palco. Ajeitei a bateria para o Ringo e, nesse ponto,
a fila já se formava na calçada, do lado de fora do Hulme. O gerente, Sr.
Wallys, já veio aso berros: "Bill, corra e abra a bilheteria! Hoje, isso
aqui vai lotar!".
Fui para a bilheteria,
rapidamente e os ingressos se esgotaram em minutos. Salão cheio, fila no bar...
Tinha de tudo: brotos, marmanjos com jaquetas de couro e o pessoal da
faculdade. O palco do Hulme não é muito alto. Da pista, dá para se tocar no
artista se você quiser. As meninas já lotavam a frente do palco e os marmanjos
lotavam, o bar. Tinha tanta fumaça de cigarro no ar, que a pista de dança
ficava nublada de vez em quando.
"Gonna tell Aunt Mary 'bout Uncle
John..." berrou Paul McCartney ao microfone para iniciar 'Long Tall Sally'
de Little Richard. As meninas já começaram com os gritos! Um pandemônio!
As músicas não paravam. Eles mandavam uma atrás da outra. Seguidas vieram
covers de Buddy Holy, Fats Domino, Chuck Berry, Elvis Presley, Chan Romero e
até um bolerão,'Besame Mucho'... Cha cha boom... Cantavam, eles para começar a
versão rock and roll deste clássico latino que a minha mãe ouvia em casa com as
amigas dela, enquanto jogavam bridge.
Os Beatles e Little Richard em 1962
Mas, uma música me chamou
atenção: 'Some Other Guy'. Não a conhecia e, mais tarde, John Lennon me contou
que era uma composição dele junto com o Paul. Muito boa a música. Bem que eles
poderiam gravá-la, com fizeram com 'My Bonnie', junto com Tony Sheridan. Já
furei o disco de tanto ouvi-la!
Outra coisa que me chamou a
atenção, e passou a me incomodar, era o fato de que as garotas, em todos os
intervalos das músicas, gritavam repetidamente: "Queremos Pete!".
Acho que incomodava a eles também. Por isso, acho eu, emendavam uma música na
outra, sem deixar o som parar. O Ringo parecia não se incomodar. Estava nítido
que ele estava se divertindo. E, cá pra nós, Ringo toca um milhão de vezes
melhor que o Pete. Tem mais pegada e swing. Talvez seja pela experiência de já
ter tocado com outras bandas.
Depois do show, eles vieram
até a bilheteria para acertar o cachê com o Sr. Wallys. Duas libras. Um
dinheirão! John, me dizia, enquanto isso, que eles voltariam para Liverpool na
mesma noite, pois tinham compromisso na hora do almoço do dia seguinte no Cavern
Club. Ele me convidou para ir até lá para vê-los: "Venha nos ver no
Cavern, Bill. Você será nosso convidado e pode ficar na minha casa", disse
ele com um sorriso no rosto e uma piscadela de canto de olho.
Agradeci o convite e os ajudei
a levar as coisas para a van. Neil Aspinall me deu 10 xelins de gorjeta por
ajuda-lo. Ótima noite. Ótima música. E, um dinheirinho a mais no bolso. Acho
que vou vê-los no Cavern, na semana que vem, na minha folga.
Por Alysson de Almeida
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