Let it Be – Histórias e Melodias
“Let it Be” foi o último álbum lançado pelos Beatles, embora sua gravação tenha precedido às sessões de Abbey Road. O projeto que inicialmente se chamaria Get Back, teria seu processo de gravação documentado e culminaria em uma apresentação com a banda tocando as músicas do álbum ao vivo. Como sabemos, o objetivo final nunca se concretizou totalmente e basicamente o que restou foi a célebre apresentação no telhado do prédio da Apple Corps, em 30 de janeiro de 1969.
Nessa sessão reunimos curiosidades sobre o processo de gravação e as ideias que levaram à construção do que viria a ser o derradeiro álbum dos Beatles que hoje completa 50 anos de seu lançamento, em um longínquo 08 de Maio de 1970. Com vocês, Let it Be!


Dig a Pony – primeiramente intitulada “Con a Lowry”, em referência ao órgão Lowry utilizado no estúdio. O refrão foi tirado de outra música do John intitulada “All I Want is You” que havia sido composta para Yoko. A ficha técnica original do disco usava esse título. Em 1972, John declarou sobre a música: “Eu estava só me divertindo com as palavras. Era uma canção nonsense. Você pega as palavras, encaixa uma na outra e vê se têm algum significado. Algumas vão ter, outras não.”
Across the Universe – É a faixa mais antiga do Let it Be. Foi gravada originalmente em 1968 e foi lançada em dezembro de 1969 em um álbum beneficiente organizado por Spike Milligan, intitulado 'No One´s Gonna Change Our World'.
John descreve que a ideia da letra surgiu após uma discussão com Cynthia. Ao tentar dormir veio-lhe a frase “pools of sorrow, waves of joy” (poças de tristeza, ondas de alegria). Ele se levantou da cama e continuou a compor até terminar a canção. “Desci a escada e a canção acabou virando algo cósmico em vez de irritado.” John valorizava a métrica da música e acreditava que não conseguiria compor algo daquele tipo novamente, além daquele momento. No fim, era uma música que falava sobre a dádiva de compor e ele descreve bem o momento de inspiração que o levou àquele momento: “Foi como estar possuído, tipo um vidente ou um médium. Você tem que fazer alguma coisa com aquilo. Só aí pode dormir.”
Apesar de admirar a composição, John nunca se conformou com a forma como ela foi gravada: “As guitarras estão desafinadas e a minha voz também”, disse ele em 1980.
Mais uma curiosidade: a brasileira Lizzie Bravo, que inclusive já foi entrevistada pelo Beatlelogias, participou das gravações dos backing vocals de "Across the Universe".

Musicalmente falando, um trecho da 'Valsa do Imperador' de Johann Strauss II foi o que inspirou George a criar uma música em compasso 3 por 4.
Dig It – praticamente um interlúdio de 49 segundos no álbum, Dig It nasceu de uma jam em que o grupo tocava “Like a Rolling Stone” de Bob Dylan. O verbo “to dig” era um termo hipster que significava algo como “entender, apreciar, curtir”.
Mesmo sendo uma canção descrita por John como “descartável”, ela refletia a filosofia que os Beatles seguiam desde 1965 de apreciar tudo com uma consciência esclarecida. “A experiência imediata, diária e presente é a razão total e definitiva para a existência de um universo”. Essa era a filosofia de Alan Watts que basicamente resumia a nossa experiência de vida a máxima de "curtir tudo a todo o momento".
Let it Be – Paul compôs Let it Be como uma forma de extravasar seus sentimentos de desalento em relação ao fim dos Beatles que a cada dia se vislumbrava mais claro. “Eu a compus quando todos aqueles problemas com negócios começaram a me desanimar. Eu estava passando mesmo por uma hora sombria.”
John se referia à música como C&G: “isso é country e gospel”. E embora a menção a mother Mary na letra pudesse indicar isso, na verdade Paul estava se referindo a sua própria mãe, Mary McCartney que faleceu quando ele tinha apenas 14 anos: “eu me deitava na cama, ficava pensando sobre o que estava acontecendo e me sentia paranoico. Certa noite, eu sonhei com minha mãe e no sonho ela dizia que tudo iria ficar bem.”
Maggie Mae – é uma adaptação de uma canção tradicional de Liverpool sobre uma prostituta acusada de roubar o soldo de um marinheiro mercante, seu cliente, e mandada para uma prisão australiana como punição. É provável que John tenha aprendido a canção com sua mãe Julia. “Eu me lembro que ela apareceu um dia em 1957, e John estava lá. Ela cantou uma versão não censurada de ‘Maggie Mae’” relatou Michael Fishwick.
I’ve Got a Feeling – A música é uma junção de duas canções: ‘I’ve Got a Feeling’ de Paul e ‘Everybordy had a Hard Year’ de John. A de Paul, otimista como sempre, e a de John era uma litania com os versos todos começando em “everybody”.
Embora, durante as filmagens de Let it Be, John tenha brincado dizendo que tinha começado a compô-la no dia anterior, na verdade, existem imagens registradas pela BBC em dezembro de 1968 em que John a canta ao violão no jardim de sua casa.
Ela foi uma das canções mais ensaiadas em todo o álbum.

Musicalmente, ela foi inspirada em Ray Charles e é por isso que Paul utiliza acordes de jazz ao piano.
A maior polêmica em torno da música, porém, foi em relação à adição de um arranjo de cordas a mando de Phil Spector que havia sido contratado no início de 1970 para terminar o álbum. Paul não aprovou o arranjo e pediu que fosse retirado, o que não aconteceu. Esse é apontado como um dos estopins que o levou a anunciar sua saída da banda em abril de 1970.
A música foi lançada como single nos EUA em maio de 1970, indo diretamente ao topo das paradas.
One After 909 – a canção mais antiga de Lennon e McCartney a ser gravada pelos Beatles. Fazia referência ao trem que eles pegavam que saia “depois do das 21:09”. A banda havia gravado uma primeira versão dela em março de 1963, na sessão da qual saiu o single “From Me to You”, mas George Martin não teria gostado dela.
For You Blue – George pretendia criar um blues simples de 12 compassos inspirado nos primeiros blues da década de 1920. George explicou:”o principal pra mim, é que é influenciada por aqueles camaradas, quando nada era profissional.” George menciona que a música que o influenciou foi “Corrina, Corrina”, de Bo Carter, gravado em 1928. “Devem ter gravado em cinco minutos. Era como eu queria fazer.” Disse ele. John respondeu: “Bom, você ainda tem mais três”.
Ge Back – Get Back surgiu com o refrão “Get back, get back to where you once belonged” e era preenchida com sons nonsense. Ao longo de três semanas, os sons foram sendo substituídos por palavras até construírem uma narrativa plausível. Paul disse: “Eu não sei sobre o que é. É sobre ir embora e aí o refrão diz ‘get back’. Na verdade, não é sobre nada.”
Chegaram a cogitar transformá-la em uma canção de protesto, com o verso “Enquanto isso, no nosso país, 20 paquistaneses habitam um grupo habitacional/ O candidato do Partido Trabalhista lhes diz qual é o plano/ E depois diz qual a realidade”. Era uma crítica ao deputado conservador Enoch Powell e sua política de reemigração. No fim, acabaram desistindo da ideia.
Musicalmente, Paul queria que “Get Back” soasse mais barulhenta e que os acordes fossem bem estridentes.
Comentários
Postar um comentário